O principal prato da culinária gaúcha é indiscutivelmente o churrasco. A simplicidade do preparo não descarta um certo refinamento. Desde os primeiros tempos, o gaúcho come churrasco. Os índios primitivos comiam carne de caça, de gado ou de potro atirada diretamente no fogo.
Os conceitos para o
churrasco são os mais variados. Antonio Álvares Pereira Coruja, em 1858,
descreveu o alimento como “pedaço de carne assada ligeiramente sobre brasas”,
enquanto José Antônio do Valle, autor do romance Divinas Pastoras,
registrou como “carne preparada sem desunir do couro, em cuja parte se aplica o
fogo”.
Popularizou-se por todo o
Rio Grande, pelas demais regiões do país e no Exterior a denominação de
churrasco no espeto para o tradicional preparo da carne pelos gaúchos. O assado
é feito na grelha ou no forno.
Conheça o verdadeiro churrasco
Assado ou churrasco: o que nasceu primeiro?
A carne assada acompanha
os gaúchos desde seus precursores. Os índios primitivos comiam carne de caça,
de gado ou de potro atirada diretamente no fogo.
O changador ou gaudério,
homem nômade com fama de aventureiro, homem sem lei e ladrão de gado, seguiu o
costume, que se ajustava a sua jornadaEle fazia a carne moqueada, assada sem
sal, que ficava completamente sapecada (levemente queimada) por fora e quase
crua por dentro, única parte que era degustada.
Até 1900, estudiosos de
vocábulos gauchescos usavam o termo assado para descrever a carne preparada
sobre as brasas. O preparo incluía levar o naco de carne sem separar o couro,
que ficava exposto ao fogo.
O jornalista Roque
Callage, em seu Vocabulário Gaúcho, de 1926, foi o primeiro a
definir churrasco como a carne sangrenta assada no espeto. “É o mais
tradicional alimento dos camponeses rio-grandenses”, delimitou Callage. Foi
este alimento que ganhou fama e popularidade no Rio Grande, no restante do País
e até no Exterior.
O assado na parrilla
(grelha) ou no forno identifica um jeito de cozinhar na Fronteira, influenciado
pelos argentinos e uruguaios.
Assado de couro
O naco de carne é cortado
da rês com o couro preso e excedendo uns quatro dedos já que, sob a ação do
fogo, o couro encolhe. Na fogueira, a primeira parte exposta ao calor é a do
couro. Depois de bem sapecada, volta-se à outra face, assada ao calor lento do
braseiro, e assim alternadamente. A carne pode ser conservada como fiambre para
ser degustada dias depois.
Assado no barro
Foi muito comum na
Campanha e é ainda usual na Argentina. A carne é envolvida por barro fresco e
enterrada no chão. Sobre a terra, acende-se um fogo forte, mantido por quatro a
cinco horas. Após esse tempo, o assado é desenterrado. O barro, endurecido pelo
calor, é quebrado e dentro, está a carne, muito apetitosa, pronta para ser
degustada.
Assado no jirau
Carne, de gado ou peixe, é
preparada sobre uma armação de varas, dispostas sobre forquilhas, que era a
grelha indígena.
Churrasco à moda gaúcha
Churrasco Campeiro
É o fogo feito no chão,
mais usual na região da Campanha. Os espetos com a carne são fincados em pé, ao
redor da brasa.
A lenha é queimada com
antecedência em uma vala com cerca de 60 centímetros de largura por 30
centímetros de profundidade.
Churrasco da Fronteira
O assado na grelha é
quase exclusividade das regiões fronteiriças. Uma influência de argentinos e uruguaios
que costumam assar a carne bem próximo das brasas.
Uma grade é armada em forma de cesto, onde é
depositada a lenha. O cesto é fixado na parede, ao lado da grelha. À medida que
a lenha vai queimando, as brasas que caem são puxadas para debaixo do assado.
Churrasco de Labareda
Muito usado quando se tem
pouco tempo para o preparo. Espeta-se a carne, que é levada para dentro do fogo
por um lado e retirada pelo outro. O espeto é virado dentro da labareda.
Toda a operação é repetida várias vezes. Em 15
minutos, o assado está pronto.
Churrasco Serrano
Estilo típico de assar da
região serrana, que abrange principalmente os municípios de Vacaria, São
Francisco de Paula, Lagoa Vermelha, Bom Jesus e a região dos Campos de Cima da
Serra.
A carne é preparada
sempre no ponto, nos espetos deitados sobre duas varas horizontais, apoiadas em
forquilhas, que correm junto às bordas de uma vala a uma altura média de 60
centímetros. A carne é movimentada, permitindo um assado uniforme.
A carne
A bovina é a preferida do
churrasco feito pelo gaúcho. Ela nunca deve ser assada logo depois de o animal
ser carneado (morto). Especialistas dizem que a carne precisa descansar
(maturar) por, pelo menos, 24 horas, tempo em que as fibras amolecem ou que
cessa o rigor mortis. Uma noite ou 12 horas já é suficiente para o preparo de
um bom churrasco.
Cortes de carne bovina
A costela é a parte mais
apreciada pelos assadores. A preferência recai sobre a da “janela”, que são as
do meio do costilhar (conjunto completo), superando a minga, que já foi a mais
requisitada. Também é bastante solicitada a costela de peito (granito), de
chuleta e da ripa da costela.
O matambre deve ser
retirado da costela antes de assar, pois endurece e compromete a qualidade do
churrasco. Fica muito saboroso se assado separadamente. É bom cuidar para não
passar do ponto. Outro integrante desse conjunto, o Vazio, é muito apreciado
devido ao seu sabor e maciez.
A picanha e a maminha são
cortes do traseiro do boi que vêm ganhando cada vez mais espaço entre os churrasqueiros.
A picanha é o corte mais nobre. Já o filé mignon, da mesma parte do boi, é
considerado um corte de mulher, que prefere a carne magra, macia e bem passada.
Ovino
É o animal preferido para
o churrasco da lida diária da Campanha.
O típico gaúcho não come
carneiro (macho adulto não castrado), que é reservado para reprodução. Opta
pelo cordeiro (com dentes de leite, até um ano), seguido pelo borrego (até dois
dentes – um a dois anos), pela ovelha (fêmea adulta) e pelo capão (macho adulto
castrado, com mais de 4 dentes (2 anos) ou boca cheia, quando mais velho).
Estes dois últimos com a carne mais rígida e de sabor acentuado.
Ave
Uma variação do
repertório de assados. O antropólogo e folclorista Carlos Galvão Krebs
descobriu que o galeto al primo canto (animal abatido depois do primeiro canto)
não era uma receita italiana.
Foi inventado nos anos 40
pelo ex-lutador de luta livre Alécio Brum, o Marreta, que, ao se aposentar,
abriu restaurantes e lançou moda em Porto Alegre com o galeto.
Mais tarde, outro
proprietário de restaurante, Don Nicola, inventou o frango prensado na chapa.
As variações do preparo do frango podem ser encontradas em galeterias por todo
Brasil.
O fogo
Carvão
Modo mais prático de
assar o churrasco na cidade. O carvão, comprado nos mercados em pacotes de 3 a
5 quilos, deve ser depositado e aceso em uma das laterais da churrasqueira,
junto à parede. Dali será retirada a brasa necessária para colocar sob os
espetos.
Ao reabastecer o carvão,
derrame-o no mesmo lugar. Um puxador de brasa é indispensável para manobrar o
estoque de braseiro. Nunca deixe os espetos de carne sobre o carvão que estiver
acendendo, pois o gás carbônico liberado satura o churrasco.
Cupinzeiro
Material especial para o
fogo e com mais calorias que a lenha, além de ser artigo facilmente encontrado
no meio rural gaúcho. O cupinzeiro dá em árvores, moirões e palanques de cercas
e até em porteiras. Queima muito bem e produz um calor intenso.
Em uma churrasqueira
caseira, é preciso cuidado para não tostar a carne. O combustível natural é
muito difundido na região de Viamão, próximo a Porto Alegre, e tem seu uso
transmitido de geração a geração de moradores.
Lenha
A carne assada no calor
do fogo de lenha fica mais saborosa. Prefira a madeira de árvores frutíferas,
como laranjeiras, bergamoteiras, limoeiros ou pereiras, que proporcionam um
sabor mais agradável ao churrasco.
Na serra gaúcha, o
guamirim fornece a melhor lenha, assim como a do bugre, que faz boa brasa e não
deixa gosto. Também é apreciada a lenha do cambuim, do maricá e da aroeira.
Devem ser evitados, por
deixarem um gosto ruim na carne, nó de pinho, cambará, bocão, pracatinga e
sete-sangrias.
Os bons churrasqueiros,
quando a pressa exige, podem assar diretamente na labareda, como no churrasco
de labareda.
Hora de assar
Sal
O churrasco mais
tradicional é temperado apenas com sal. Se a quantidade de carne for grande,
salgue antes de levá-la ao fogo. Sempre que possível aplique o sal quando o
assado estiver “passando da metade”, no chamado tempo de apronte, pois acentua
o sabor.
Tempero
A proliferação de
churrasqueiras no cenário urbano gerou um tipo de assador de fim de semana dono
de uma criatividade duvidosa no preparo da carne que vai ao fogo.
Não há regra nem limites
na busca de um churrasco “melhor, mais macio e saboroso”. Nesse autêntico
vale-tudo, usa-se: tempero em folhas, leite, cerveja, cachaça, conhaque,
bicarbonato de sódio, leite de mamão verde e outras invenções.
Mas atenção: experimentos caseiros certamente alteram
o gosto da carne.
Ponto
Todo bom assador tem
sempre, ao servir, alternativas de carne no ponto, malpassada e bem-passada
para atender todas as preferências de paladar.
Acompanhamentos
A farinha de mandioca e o
pão formam um conjunto inseparável do churrasco. A diversidade de
acompanhamentos aumenta conforme a região ou etnia, disputando o apetite antes
reservado primordialmente à carne.
- Campanha: batata-doce e a mandioca.
- Serra: saladas com verduras e maionese (batatas).
- Cidades (residências ou nos restaurantes): salada de batata com maionese, verduras, pão com alho, salsichão até feijão mexido.
Todas essas combinações
provam, antes de tudo, a profunda interação do churrasco com o paladar do
gaúcho, que busca harmonizar usos e costumes ao principal prato da sua
culinária.
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